Entrevista: Alexandre Matias
Durante o feriado de páscoa, vamos recuperar algumas das entrevistas e textos que fizemos para o MÚSICA CHAPPA QUENTE e que foram publicadas no site do evento. Depois de quatro semanas com debates de altíssimo nível, vamos tentando retomar a vida normal. Desde já, aproveito para agradecer a todos que visitaram o site do MCQ, a todos os convidados e principalmente a todo mundo que esteve presente nas oito mesas de discussão. Já já, a CHAPPA esquenta de novo.
Pra começar a retrospectiva, o troco em Alexandre Matias.
**********************
Há doze anos, Alexandre Matias começou a atuar no jornalismo cultural. 2007-12=1995. (1995-2007). Impossível não associar esse período ao crescimento da imprensa on-line. Matias é um dos principais nomes do jornalismo musical brasileiro e, além de colaborar com grandes órgãos da imprensa do país, põe no ar o blog/zine TrabalhoSujo.
Ele é um dos jornalistas que acompanha mais de perto as inovações comportamentais e tecnológicas trazidas pelas novas plataformas on-line de suporte à música. Antes de participar do MÚSICA CHAPPA QUENTE, na mesa sobre este tema (21/03, às 14hs. UFRJ), ele deu alguma de suas respostas para o CHAPPA.
(por Bruno Maia)
:: Que negócio é esse que está por trás de Napster, iTunes, YouTube, MySpace?
AM: Responder "Long Tail" ou "Web 2.0" é resumir demais, tanto em uma teoria só, como em uma atividade do mercado. Acho que o que tá rolando diz mais respeito ao fato de que as pessoas finalmente aprenderam a usar a internet e aos poucos estamos derretendo o muro entre o real e o virtual. Nao havia este muro quando foi inventado o telefone, a televisão ou outra forma de mídia - mas o aspecto da internet ser uma via de duas mãos criou essa realidade paralela, em que se parecia ser habitável longe da vida real, mas que era uma ilusão. O ser humano sempre criou "second lives" em sua cabeça (quer mundo virtual maior do que a escrita?), mas agora estamos começando a ter consciência sobre isso. Quanto à pergunta, eu trocaria o iTunes (uma loja virtual ligada a um software proprietário) pela Amazon, devido ao sistema de recomendações da loja do Bezos, e incluiria o movimento software livre, o verdadeiro pai da matéria. Foram eles quem lançaram o conceito de colaboração na prática, aplicado comercialmente pela primeira vez pela Amazon, no seu sistema de dicas de compras.
:: O Drew Shuttle, da Wired, disse que a tecnologia é o rock'n roll dos nossos tempos. Se for por aí, já apareceram os Beatles ou ainda estamos no Chuck Berry?
- Tecnologia é ferramenta, é o que nos difere dos animais. É a habilidade do ser humano de criar ferramentas: garfo, cadeira, estilingue, nave espacial. O termo tecnologia é usado para vender equipamentos, mas o grande barato é o termo eletrônica, a linguagem pós-industrial, em que tudo acontece ao mesmo tempo. Esse talvez seja não o novo, mas o próprio rock'n'roll - tem que lembrar que o rock é uma atividade colaborativa (bandas em vez de artistas solo) e total 2.0 (no sentido "eu também posso" do termo). O aspecto participativo e a possibilidade de ser ouvido num monólogo disfarçado de diálogo (a mídia pré-internet) - isso é o verdadeiro rock'n'roll. E, sim, já temos os nossos Beatles, nossos Sex Pistols, nossos Kraftwerk e nosso gangsta rap. Todo ano teremos novos nomes, prontos para se encaixarem nos parâmetros pré-concebidos. Mas a história aqui (mesmo parecendo começar na mesma proverbial garagem das bandas de rock) tem outros padrões e patrões - é a primeira vez que o underground milita no mainstream como causa. Jobs e Gates saqueando a Xerox para vender para a IBM é algo parecido como os Sex Pistols, o gangsta rap, o Kraftwerk e os Beatles ao mesmo tempo.
:: Se você fosse um executivo da Google com a palavra final sobre investir ou não US$ 1,7 bilhão num modelo de negócio como o do YouTube, o que você faria?
- Se eu soubesse o que fazer com a pirataria no YouTube, sim, porque a mídia espontânea dessa negociação consolidou a importância do Google no imaginário coletivo. E é como se eles dissessem: o que tiver de bom e novo por aí, a gente compra. Acredito que eles tenham uma resposta pra isso, mas não deve ser posta em prática rapidamente e envolverá inúmeros acordos com diferentes grupos de mídia - e aí acho que o próprio Google deverá comprar alguns veículos tradicionais para garantir seu próprio conteúdo. Além de seguir a mesma lógica do "pode vir que a gente compra" que eu disse antes.
:: Cada vez mais a vida on-line a off-line das pessoas se mistura. Os olhares de um jornalista diante dessas duas realidades devem ser diferentes ou o princípio que os rege é o mesmo?
- Cada vez mais, essa separação torna-se uma ruína. É uma separação próxima de um outro tipo de vida virtual, quando o sujeito leva uma vida dupla - o bancário que é gótico, a executiva que pratica S&M, o advogado que curte rock e moto no fim de semana. Isso sempre existiu, sempre vai existir. Mas a internet aumentou essa ilusão e agora está ruindo. Você ganha muito mais se todo mundo souber de todas suas facetas - a não ser que você esteja fora-da-lei ou mal intencionado, que é outra história (e também, outra "second life").
:: A obra musical sempre sofre mudanças estéticas derivadas das inovações tecnológicas e comportamentais que surgem em volta dela. Você acha que isso já acontece nesse momento, sob influência dos myspaces, youtubes e napsters?
- Com certeza. Bandas lançam singles mais do que nunca, vídeos promocionais são pensados por diferentes setores do mercado da música, ações de empresas já são usadas pelas plataformas citadas no título do debate no MCQ.
:: Para a mesa YOUTUBE, MYSPACE, NAPSTER, ITUNES: AS NOVAS PLATAFORMAS ONLINE, do Música Chappa Quente, quais você acha que são as principais questões que precisam ser levantadas?
- Acho que o principal ponto é discutir a natureza social da internet - esta separação entre "real" e "virtual". As pessoas aos poucos estão se associando a marcas e personalidades como uma forma de afirmar seu estilo de vida ou caráter - e isso é cada vez mais consciente a partir da lógica do link. Quer dizer, você não precisa mais endossar, basta linkar. Em paralelo a isso, vem a cultura mashup, fundir justamente estes links e criar universos novos que não são tão novos assim.
:: Alguma outra questão para alguma outra mesa?
- Sempre tem, mas já digitei demais por hoje.
:: Algo mais a acrescentar?
- Sim. Desliga o computador e vai dar uma volta.
AM: Responder "Long Tail" ou "Web 2.0" é resumir demais, tanto em uma teoria só, como em uma atividade do mercado. Acho que o que tá rolando diz mais respeito ao fato de que as pessoas finalmente aprenderam a usar a internet e aos poucos estamos derretendo o muro entre o real e o virtual. Nao havia este muro quando foi inventado o telefone, a televisão ou outra forma de mídia - mas o aspecto da internet ser uma via de duas mãos criou essa realidade paralela, em que se parecia ser habitável longe da vida real, mas que era uma ilusão. O ser humano sempre criou "second lives" em sua cabeça (quer mundo virtual maior do que a escrita?), mas agora estamos começando a ter consciência sobre isso. Quanto à pergunta, eu trocaria o iTunes (uma loja virtual ligada a um software proprietário) pela Amazon, devido ao sistema de recomendações da loja do Bezos, e incluiria o movimento software livre, o verdadeiro pai da matéria. Foram eles quem lançaram o conceito de colaboração na prática, aplicado comercialmente pela primeira vez pela Amazon, no seu sistema de dicas de compras.
:: O Drew Shuttle, da Wired, disse que a tecnologia é o rock'n roll dos nossos tempos. Se for por aí, já apareceram os Beatles ou ainda estamos no Chuck Berry?
- Tecnologia é ferramenta, é o que nos difere dos animais. É a habilidade do ser humano de criar ferramentas: garfo, cadeira, estilingue, nave espacial. O termo tecnologia é usado para vender equipamentos, mas o grande barato é o termo eletrônica, a linguagem pós-industrial, em que tudo acontece ao mesmo tempo. Esse talvez seja não o novo, mas o próprio rock'n'roll - tem que lembrar que o rock é uma atividade colaborativa (bandas em vez de artistas solo) e total 2.0 (no sentido "eu também posso" do termo). O aspecto participativo e a possibilidade de ser ouvido num monólogo disfarçado de diálogo (a mídia pré-internet) - isso é o verdadeiro rock'n'roll. E, sim, já temos os nossos Beatles, nossos Sex Pistols, nossos Kraftwerk e nosso gangsta rap. Todo ano teremos novos nomes, prontos para se encaixarem nos parâmetros pré-concebidos. Mas a história aqui (mesmo parecendo começar na mesma proverbial garagem das bandas de rock) tem outros padrões e patrões - é a primeira vez que o underground milita no mainstream como causa. Jobs e Gates saqueando a Xerox para vender para a IBM é algo parecido como os Sex Pistols, o gangsta rap, o Kraftwerk e os Beatles ao mesmo tempo.
:: Se você fosse um executivo da Google com a palavra final sobre investir ou não US$ 1,7 bilhão num modelo de negócio como o do YouTube, o que você faria?
- Se eu soubesse o que fazer com a pirataria no YouTube, sim, porque a mídia espontânea dessa negociação consolidou a importância do Google no imaginário coletivo. E é como se eles dissessem: o que tiver de bom e novo por aí, a gente compra. Acredito que eles tenham uma resposta pra isso, mas não deve ser posta em prática rapidamente e envolverá inúmeros acordos com diferentes grupos de mídia - e aí acho que o próprio Google deverá comprar alguns veículos tradicionais para garantir seu próprio conteúdo. Além de seguir a mesma lógica do "pode vir que a gente compra" que eu disse antes.
:: Cada vez mais a vida on-line a off-line das pessoas se mistura. Os olhares de um jornalista diante dessas duas realidades devem ser diferentes ou o princípio que os rege é o mesmo?
- Cada vez mais, essa separação torna-se uma ruína. É uma separação próxima de um outro tipo de vida virtual, quando o sujeito leva uma vida dupla - o bancário que é gótico, a executiva que pratica S&M, o advogado que curte rock e moto no fim de semana. Isso sempre existiu, sempre vai existir. Mas a internet aumentou essa ilusão e agora está ruindo. Você ganha muito mais se todo mundo souber de todas suas facetas - a não ser que você esteja fora-da-lei ou mal intencionado, que é outra história (e também, outra "second life").
:: A obra musical sempre sofre mudanças estéticas derivadas das inovações tecnológicas e comportamentais que surgem em volta dela. Você acha que isso já acontece nesse momento, sob influência dos myspaces, youtubes e napsters?
- Com certeza. Bandas lançam singles mais do que nunca, vídeos promocionais são pensados por diferentes setores do mercado da música, ações de empresas já são usadas pelas plataformas citadas no título do debate no MCQ.
:: Para a mesa YOUTUBE, MYSPACE, NAPSTER, ITUNES: AS NOVAS PLATAFORMAS ONLINE, do Música Chappa Quente, quais você acha que são as principais questões que precisam ser levantadas?
- Acho que o principal ponto é discutir a natureza social da internet - esta separação entre "real" e "virtual". As pessoas aos poucos estão se associando a marcas e personalidades como uma forma de afirmar seu estilo de vida ou caráter - e isso é cada vez mais consciente a partir da lógica do link. Quer dizer, você não precisa mais endossar, basta linkar. Em paralelo a isso, vem a cultura mashup, fundir justamente estes links e criar universos novos que não são tão novos assim.
:: Alguma outra questão para alguma outra mesa?
- Sempre tem, mas já digitei demais por hoje.
:: Algo mais a acrescentar?
- Sim. Desliga o computador e vai dar uma volta.
0 Opine:
Postar um comentário
<< Home