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23.4.07

Entrevista: Pedrão Selector (1)

A Percepção Do Que É O Direito Deles

foto: Joca Vidal


      As discussões da música digital passam sempre por uma série de questões sobre a viabilidade do modelo que abandona a venda de disco, de singles. Ninguém tem a resposta para o sustento do compositor, os palpites para o que vai ser da gravadora sem a garantia fácil dos hits, do artista sem os fáceis mimos, ou dos futurólogos sem bola de cristal. Nesse clima, Pedrão Selector foi um cara que eu achei que podia ter uma visão interessante. Não é compositor (ainda), não é o artista. É músico novo, mas participa dos processos de decisão do Seletores de Frequência, o grupo que acompanha o B Negão por festivais do Brasil e da Europa.
      Tudo começou com a experiência pouco lucrativa de lançar um disco autobancado para ser vendido em banca de jornal. (Já tinha começado antes, mas vamos facilitar as coisas para o meu lado.) Daí foi adotar a liberdade radical da internet como plataforma oficial de divulgação, antes de parar para ler o que é o tal do Creative Commmons, e assumir a liderança da defesa do modelo que não comporta a venda de música gravada como parte relevante da conta do sustento. Pedrão não só é trompetista (um instrumento que entra na fila de dispensa antes da guitarra, do baixo, e da bateira) do Seletores, como faz live pa em festas e investe em projetos próprios, disponíveis nas duas páginas do myspace que alimenta. Ou seja, se vira para viver com música.
      Papo que começou na praia, no ano passado, foi para ligações por telefone, combinações nos intervalos da festa Phunk, onde é titular, emails enquanto passou um tempo em Barcelona... até que passamos tudo a limpo em uma mesa de bar em Botafogo, zona sul do Rio, no fim do ano passado. Já com o Bruno de coleguinha ali do lado. Não foi só uma garrafa, que o sobremusica não é disso, então a historinha chega dividida em dois. Aqui, o início...


sobremusica: Fala um pouco dessa história de você ter entrado na faculdade de jornalismo e ter saído de lá músico trompetista.
Pedrão Selector: Cara, na verdade eu já tocava antes de entrar na faculdade. Entrar na Eco [Escola de Comunicação da UFRJ, entre 95 e 01] foi conseqüência, foi aquela coisa de você ter que fazer uma faculdade, não saber o que vai fazer, e tal. E acabei indo lá pro jornalismo, mas sempre mantive esse negócio de tocar.

sm: Mas tocava como? Banda?
PS: Eu entrei na faculdade muito moleque, mas tinha tido banda de escola, aquela coisa. Tinha que desenvolver. E tocava rock, basicamente.

sm: Trompete?
PS: Não, guitarra. Fui começar a tocar trompete com vinte anos. E sempre toquei guitarra desde os treze, quatorze anos. Bom, fiz faculdade com aquela malucada de Comunicação. Você acaba conhecendo vários malucos, que tocam, e se juntam para fazer uma banda. Uma parada mais séria, digamos assim. E conheci uma galera, fizemos uma bandinha da universidade, e foi se aprofundando. Conheci mais gente de música, e tal, e isso virou meu foco principal. A faculdade virou uma coisa mais por... por fazer. De buscar a profissão, a formação.

sm: Mas foi na faculdade que você fez parte do início da Pelvs?
PS: Isso, na faculdade eu tinha uma banda chamada Os Elétricos, que era com o [Genu] baixista da Pelvs. E foi nessa época que eu comecei a estudar trompete, comecei a ouvir muito jazz e tal. Comecei a querer um instrumento de sopro, e foi o trompete, no caso.

sm: Pode falar um pouco mais dessa relação de começar a ouvir jazz e começar a tocar trompete? Falar mais no teu envolvimento pessoal com o trompete, pelo menos nesse início.
PS: Foi uma coisa assim: comecei a ouvir mais jazz, sendo que eu era roqueiro de carteirinha, clássico, de ouvir os discos clássicos de rock. Daí, comecei a ouvir jazz e vi que instrumento de sopro sempre foi uma parada que me interessou. Quando eu era moleque eu gostava de flauta, de flauta transversa, e tal. E eu decidi que ia tocar. Daí, tinha sax, trompete, não sei o que. Mas dentro do jazz, quem mais me inspirou foi Miles Davis, mesmo: Bitches Brew, Nefertiti... E eu falei: é essa parada que eu quero aprender. Ainda mais porque os saxofonistas, hoje em dia, não são mais uma referência. Um camarada meu é que fala que o saxofone é uma arma branca, tinha que ter uma licença para usar aquela porra. Você pode fazer uma coisa horrorosa com aquela merda. E o trompete é uma coisa elegante, e tal. Isso foi em 96. Aí, quando eu comprei o trompete para estudar, eu já tinha essa bandinha da faculdade. E esse outro pessoal tinha gravado o disco da Pelvs com arranjo de metal, mas com tudo tocado em teclado, né? E nêgo foi e me chamou: a gente vai fazer o show de lançamento do disco, tira os arranjos de metal você. São umas frases simples... Então, com seis meses de trompete, eu já tava tocando com a Pelvs. Rarrarrá. Mal sabia soprar direito a parada, mas já tava tocando com os caras.

sm: Mas já era a tua praia isso de ser surf music, com indie...?
PS: Não muito. Eu não era muito indie, não. Daquela galera, eu era o menos indie. Eu era mais rock’n’roll anos 70, 80. Coisas mais básicas. E eu gostava de reggae, mas aquela coisa assim. Entre os indies, eu destoava muito. Inclusive as bandas que nêgo tinha como referência, eu nunca tinha ouvido. Foi um lance de que eu queria ter uma banda para tocar, e bem ou mal, eles, eu conhecia. E viraram meus amigos depois. E eu passei a conhecer mais bandas, dessas aí. E comecei a gostar depois.

sm: E esse período de Pelvs durou quanto até o Manifesto 021?
PS: Pelvs e Manifesto, isso acabou acontecendo simultaneamente. Na Pelvs eu comecei em 97, quando rolou o [disco] Members to Sunna, e fiquei até 2000, 2001. Foi o ano em que eu me formei, porque na verdade eu demorei muito para sair da faculdade. Fiquei dois anos para entregar a monografia, aquela coisa básica. E teve uma época que eu toquei em algumas bandas, foi aí a Manifesto [banda que chegou a acompanhar Gérson King Combo]. E só depois, quando surgiu o lance do Seletores, foi que eu decidi ficar mais focado em uma coisa só. Mas eu já toquei em umas coisas bem absurdas. Rarrarrá.

sm: Mas o que eu acho legal, e queria que você comentasse, é essa passagem do Manifesto - que junto com o MCs HCs faziam os shows de funk que rolavam no Rio - para o Seletores, que foi o que ficou, passada essa fase.
PS: É, pois é. Na verdade eu comecei a tocar com o B Negão na época do Funk Fuckers, acho que era 99. Finzinho da banda. A Funk Até o Caroço era uma música do Funk Fuckers, depois virou do Seletores. Teve um show que foi Manifesto e Funk Fuckers, num lugarzinho pequeno ali em Botafogo que eu nem me lembro o nome. Aí o B Negão falou: pô, tu não toca trompete no Manifesto? Tem uma música nossa que é em ré, chega lá e faz uma jam com a gente, é um funk. E eu comecei a tocar com eles, mas era uma participação no show. Fazia umas três, quatro músicas. Até que a banda acabou. Nisso, o Bernardo [B Negão] foi fazer o projeto solo dele, e me chamou até formar o Seletores. Levamos dois, três anos nisso.

sm: Mas tu começou na FF com Funk Até o Caroço e ficava meio solto, jam, como era isso?
PS: É, a gente definia. Tinha umas músicas antigas em que cabia trompete, a gente fazia os arranjos. Mas eu comecei como participação, não fazia o show todo. Eu não era efetivo da banda. E ela acabou não indo pra frente por lances de gravadora, não conseguiram liberação para se lançar, e acabou que morreu. Daí, o B Negão tava com essa outra história, me chamou. No começo era eu, ele e dj [Rodriguez], depois foi juntando [o guitarrista Gabriel] Muzak, [o baterista] Pedrinho [Garcia], nananan, até virar a banda que gravou o disco.

sm: Mas, vamos voltar um pouquinho. Você falou que era roqueiro, passou a ouvir jazz, ouvir indie. E o funk, começou quando?
PS: O funk a sério começou com a galera do Manifesto. Eu já era fã de Funkadelic e Parliament, fui no show do George Clinton aqui no MAM, em 95 eu acho [96, na verdade].Então nessa época eu tava na Pelvs, Os Elétricos ainda tocava uma vez ou outra, e o Manifesto... Eu conhecia a produtora, acho que ela estudava na faculdade, e eles tavam procurando um trompetista. “Chega lá, pra conhecer a galera”. Eu fui, achei legal a onda de misturar hip hop com funk, era novidade pra mim... Vamos nessa. E fiquei lá uns dois ou três anos, até a banda acabar. Rarrarrá.

sm: Engraçado, você falou que o jazz te levou para o trompete, e na verdade depois que você assumiu o instrumento você passou por um monte de coisa... mas não pelo jazz em si. É isso mesmo?
PS: Na verdade, eu sempre me interessei por vários tipos de música, sabe? Eu toco música do jeito que eu consigo entender, assimilar, e jogar pra fora. E o lance jazzístico foi surgir [como instrumentista] mais no Seletores, mesmo. Na Pelvs era tudo muito certinho, no Manifesto até tinha improviso, mas era preso no funk, e aí no Seletores é que o jazz ajudou mesmo por causa disso tudo.
Mas a própria coisa do dub, eu fui começar a escutar... [sm: outro dia....] Não outro dia, mas foi com o Bernardo, que foi me mostrando: escuta isso aqui que é bom... Lee Perry, não sei que. Eu nunca tinha ouvido falar. U-Roy, essas coisas. Ele foi me dando as dicas, eu comecei a pesquisar também, né? E ainda bem que hoje em dia, com isso de Internet, pode baixar até coisa da Tchecoslováquia que tá maneiro... Rarrá.

sm: Ainda no jazz, você chegou a estudar formalmente, ou é uma coisa de ouvir?
PS: Não, eu estudei. Estudei na [Escola de Música] Villa-Lobos dois anos e meio, nessa época, 96, mas o negócio do academicismo me deixou assim... e teve uma hora que eu enchi o saco e fui seguir a minha onda mesmo. Estudar do meu jeito.

sm: Mas então eu queria voltar para o teu caminho pelas bandas aí. O Seletores até levou um tempo do formato contigo e dj até virar banda. Mas uma vez banda, a gravação do disco não demorou, né? Conta aí esse percurso.
PS: É, foi uma coisa bem natural, porque todo mundo já se conhecia, já tocava. O Pedrinho tocava no Cabeça, que tocava com o [baixista] Kalunga, que o Bernardo também chamou pra tocar. Quer dizer, foi rápido. Quando a gente viu a banda já tava ali, sacou? Mas tirando as músicas que já existiam, que eram anteriores, todo mundo participa muito do processo de composição. Ele tem um direcionamento porque está à frente da parada, mas é um trabalho de grupo e sempre foi. O lance de dj era provisório, mesmo, e nem rola mais. Só em situação especial [referência à participação de B Negão na festa Phunk de aniversário, onde a entrevista foi acertada].

sm: E passado já um tempo do lançamento do disco, como você avalia ele ter sido gravado aos poucos, em mais de um estúdio?
PS: Cara, foi bom porque teve um tempo de maturação da parada bem maneiro. A gente já vinha tocando aquelas músicas há mais de um ano. Então foi proveitoso, em vez de resolver em um mês, ir pouco a pouco galgando a parada.

sm: Quanto ao lançamento do disco. Saiu primeiro pela revista Outracoisa, né, ficou um tempo sendo divulgado, e depois o B Negão botou o disco lá no CMI [site do Centro de Mídia Independente] para ser baixado de graça. Como foram esses papos entre a banda para se chegar a essa decisão?PS: A história lá da Outracoisa não foi muito boa, assim. No fim das contas, foi muito acordo verbal, não sei o que, e assim: a gente não ganhou dinheiro com aquele disco. Sabe qual é? A verdade é essa. Financeiramente foi um péssimo negócio. Pra gente.

sm: Porque o cd já tava pronto quando foi lançado, né?
PS: Já tava pronto. A gente entregou o disco pronto para a Outracoisa.

sm: E essa idéia de botar para ser baixado tem a ver com não ter ganhado grana?
PS: Não, não, não. A gente sempre teve essa política de que a música tem que ser acessível para todo mundo, sabe qual é? O que importa é que nêgo esteja escutando a nossa música, entendeu? Botar pra download vai formar um público maior para a gente. Vai ter gente que vai querer comprar o cd, ter o disquinho, e tal, mas essa questão de que tem que vender, vender, vender... Isso já tá esgotado. Pensa bem, olha a quantidade de pessoas que só puderam conhecer a nossa música baixando, ou porque na cidade onde eles moram não tem cd pra comprar, ou porque estão em outro país, enfim... Bem ou mal, vai se atingir um público ali. E quando a gente for fazer show, o cara vai lá, entendeu? E se a gente estiver vendendo, o cara pode querer comprar o cd. Eu acho que isso facilita tanto a vendagem quanto a divulgação da própria música.

sm: Tá, mas o B Negão foi um dos primeiros a assumir a decisão de botar o disco pra baixar. Não é que tenha vazado. E até hoje, quando se fala em uma outra coisa que é o Creative Commons, o exemplo brasileiro é o do B Negão. Que já viajou com o show para Europa, Roskilde, Barcelona...
PS: É, para Barcelona, na verdade, eu fui sozinho [em 2006, no ano anterior eles foram sim para a cidade espanhola]. O B Negão com o Seletores foi para Berlim. É um festival grande, me esqueci o nome... Voltado para a indústria mesmo... [sm: Popkomm?] Isso. Mas na verdade eu acho que nêgo sempre teve um receio muito grande de mostrar a cara e assumir: quer baixar, pode baixar. E o Bernardo foi uma pessoa que sempre esteve ali: meu irmão, vai na Internet que tem. Porque até antes de entrar em Creative Commons, e antes do CMI, ele já falava: procura no Emule que tem, pode baixar que tem. A gente não tá interessado em ganhar trocado com essa parada.

sm: E tentando seguir nessa linha de pensamento. Você que é músico, instrumentista, pode falar não só por experiência pessoal como por troca de impressões no meio: uma coisa é ser o artista que assina o trabalho, e liberar aquilo de olho nos frutos de aumento de público, e tal. Mas e para a banda de apoio, para quem é contratado do artista? Qual é a diferença, o que mudou nesse novo mundo?
PS: É, na verdade, no Seletores não tem essa questão de contratado. A gente divide por igual. [sm: mas a pergunta nem é tanto Seletores, é mais para você músico nos teus vários trabalhos, a história dos direitos conexos...] É, cara, mas se você for pensar que a arrecadação de direito autoral no Brasil é essa merda que é. De três em três meses, pinga uma merrequinha, é muito pouco. Eu, músico, eu ganho é fazendo show. Ou gravando, mas menos. Quem tá contra o acesso livre é galera amarrada às gravadoras, que estão no início da decadência e... Num futuro próximo, não vai mais existir gravadora. No sentido que existe hoje, eu digo, como uma instituição que tem seus artistas. Cada um vai editar e lançar da própria maneira, e vai ter um pool de artistas reunidos que vão botar isso disponível da melhor maneira possível. Agora é que os músicos estão tendo mais percepção do que é o direito deles, na verdade. A minha música é minha, se eu quiser dar, eu dou. Se eu quiser vender, se eu quiser trocar. Antes, a música era da gravadora, o disco era da gravadora. [A Internet] É uma ferramenta a mais de divulgação que você tem, e não impede você ganhar grana de execução no rádio, de regravação... Das formas antigas. Acho até que a Internet é pra impulsionar as outras mídias.

sm: O que eu continuo insistindo, é se o problema pra você está no fato de que tanto faz abrir mão ou não, ou se é porque sendo mal pago, o benefício compensa o pouco que se ganharia. Quer dizer, é ideológico o uso da Internet?
PS: É ideológico.

sm: E nessa coisa de viajar, fazer show lá fora. O Creative Commons é um assunto que surge em entrevista, em papos com outras bandas?
PS: Cara, eu posso te jurar que eu não vejo isso lá fora. Essa bola levantada dessa forma.

sm: Mas não vê levantada com vocês, ou no geral?
PS: No geral. Não me lembro de ter visto.

sm: O B Negão fala que as viagens de vocês pra Europa...
PS: [interrompendo] Não é que levou a gente. Mas o fato de que a gente disponibilizou as músicas... [pensa] A primeira vez que a gente tocou em Barcelona [2005], foi porque um dos produtores lá tinha baixado da Internet e gravado um cdzinho, e o cara que fazia o [palco] de música brasileira, produtor também, ouviu, achou maneiro e chamou a gente. Então é meio que por tabela, sabe qual é?



Nada a ver

Nos EUA, o bicho pega para o lado das rádios online, Pandora incluído. Resumindo, a Comissão de Dirteito Autoral do Congresso aprovou um projeto de lei que triplica a taxa de veiculação de música na internet, e isso inviabiliza tudo. Tá rolando um abaixo-assinado para vetar antes que vire lei.



Nada a ver

Pedrão está até em show de sapateado:



Nada a ver

Bruno Maia pede para avisar que vem aí a primeira parte da matéria com o Moptop. Na quarta-feira.


Roskilde '07:: Néon verde-amarelo
Maldade...
Show:: Lee Perry
Fino Coletivo no Cinemathèque
Completando os sentidos...
MAGIC NUMBERS NO BRASIL !!!!!!
DFA 1979, Panic! At the Disco, Gabriel Benni
Se você tem um videoclipe...
New Rave (Old Punk)
"Abriram o portal..."

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