Show:: Lee Perry
A noite começou a se explicar quando Cristiano DubMaster, do Digital Dubs anunciou: “o que vai acontecer aqui é uma noite de glorificação”. Ok, o misticismo estava posto, as gudi vaibes tomavam conta do ambiente e a fumaça ainda era pouca. Assim como eram poucas as pessoas que se dispuseram a assistir o show de abertura.
fotos: Bernardo Mortimer
A banda que acompanharia Lee Perry subiu primeiro ao palco e não pareceu ser a suíça White Belly Rats, tão falada antes do show. De White e de suíço os caras não tinham nada. Uma busca por imagens no Google confirmam essa suspeita. Admito a falha de não ter descoberto o nome da banda que era pura explosão jamaicana. Nada de white, tudo de black, nada de scratch, tudo de roots, nos melhores sentidos que esses termos possam tomar quando o assunto é reggae-não-iô-iô. Nada de programação. Reggaezão de banda, cascudo, tenso, conduzido por um baixo impressionante. O que dava um quê de dub eram mesmo os efeitos lisérgicos da guitarra e um ou outro disparo da mesa de som na saída do mic de Perry. De resto, o som da banda se aproximava mais das bases dos anos 80, com o teclado à frente – mas que não chegava a ser um dancehall –, do que propriamente do dub.
A voz de Lee Perry beirava o esquizofrênico. Não tinha importância nenhuma a rouquidão a que os quase 71 anos lhe condenam. Ele trabalhou como um verdadeiro mestre de cerimônias, saudando, benzendo, falando sandices e desfilando história. O que Dubmaster havia previsto aconteceu. Glorificação. Glorificação de Lee Perry, glorificação do reggae, glorificação do Brasil, glorificação da macumba, glorificação de tudo.
O show durou pouco mais de uma hora. O MC Perry entrou com uma bolsa a tira-colo que deixou todos curiosos sobre o que sairia dali. Não saiu nada. No seu microfone à la terno do Falcão, cheio de penduricalhos, um espelho que por vezes refletia os holofotes direto no olho do vovô doidão. Noutros momentos, Perry resolvia saltar sobre uma perna só. O que ele queria mostrar? Que podia desafiar a artrose? O coração da platéia acelerava. Lá pelas tantas, Lee Scratch resolveu abrir os braços na frente do pedestal do microfone, que estava em sua mão direita. E desandou a falar com o pedestal. Foram umas duas frases até que ele percebesse que não estava saindo som, já que o microfone estava em sua mão estendida e não no pedestal. Lee Perry pegou uma rosa branca da platéia. Se emocionou e não largou mas as pétalas. O caule ficou em algum lugar do palco. Ele expulsou os demônios das pessoas, exorcizou a violência do Brasil e foi embora. Fez uma pajelança quando cantou pra chover. “I wish it would rain”, de Marvin Gaye. E se saísse dali com aqueles trajes pra dormir na calçada, ninguém daria muita atenção.
Lee Perry é uma espécie de Nélson Sargento mundial. Se o nosso sambista não recebe tal louvação (ou seria glorificação?) por aqui, bem que poderia. Mais do que desfilar sua arte, ambos carregam suas história pelo mundo e o valor que elas, em si, representam. No caso de Perry, a super-banda ajuda e muito. A loucura o transforma num freak-do-bem. E tudo isso misturado cria uma atmosfera única e uma lembrança desse fragmento de História que o Circo Voador viveu.
ficha técnica:
Lee Perry
Rio de Janeiro, 14 de abril de 2007
Circo Voador
abertura: Digital Dubs
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Aliás, o som do Circo estava espetacular. Coisa rara. Vale o registro.
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E também vale frisar que o show era pra ser uma edição carioca do Abril Pro Rock. Era. A produção não providenciou nenhuma citação, nenhum banner, nenhum backdrop ou um fundo de palco que remetesse ao festival e aos patrocinadores – entre eles a Petrobras e o Governo de Pernambuco – que viabilizaram, com o dinheiro público, tal iniciativa. Nenhuma menção dentro do Circo Voador. É o tipo de cuidado que não se pode deixar de ter, ainda mais num momento onde toda a política cultural do Brasil é financiada por iniciativas públicas. Eu, pelo menos, fiz a minha parte e fui com a camisa do festival. Edição 2005.... Não custava ajudar...
Isso sem falar na divulgação precária feita para um evento desse porte no Rio de Janeiro. Parece que isso está virando moda.
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Vale o registro. O SOBREMUSICA começou há exatos dois anos, nesse tal Abril Pro Rock 2005. Coincidência ou não, esse é o post de número 400 desde então - talvez a gente chegue ao 1000 antes do Romário -, e traz justamente um um texto da edição carioca do APR. Pra completar, hoje o site chega a marca de 50 mil páginas vistas. Não é nada, não é nada... Não é nada.
De qualquer forma, a família agradece por tudo.
3 Opine:
parabens pelos "aniversarios" e pela resenha do show...
qto ao post 1.000 antes do romario não há duvidas... a não ser que o baixinho arrume um amistoso contra o XV de Piracicaba.
abraços!
linkei a crítica do show do perry no meu blog.
1 abs,
chicodub
parabéns mais que merecidos, bruno e bernardo.
vocês arrebentam.
sou fã.
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