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Bernardo Mortimer
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Bruno Maia
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10.1.06

A Importância de Ouvir

       O Timor Leste foi uma colônia portuguesa desde o século XVI até 1960, quando a ONU classifica a porção oriental de uma das ilhas da Indonésia como território sem auto-governo com prazo para iniciar processo de autonomia. O fim do Salazarismo em Portugal foi o impulso para a independência do Timor, e a independência do Timor o impulso para – dez dias depois – a invasão da Indonésia. As Nações Unidas protestaram, não reconheceram a anexação, e mantiveram o povo timorense sob os auspícios do governo português. Ninguém na Ásia prestou atenção.
       A administração indonésia é violenta e brutal, com crimes contra qualquer resistência mais organizada. Só com a renúncia do ditador Suharto, em 98, o Timor Leste (sim, existe o Timor Ocidental) ganha apoio internacional e começa a reivindicar a tardia independência.
       Um ano depois, em maio de 99, Portugal e Indonésia assinam um acordo. O povo timorense decidirá em referendo popular conduzido pela ONU se quer a independência ou ter autonomia e se manter parte da Indonésia. Comparecimento de 98% da população dá vitória de 76% à independência. Em vez de festa, ataques de milícias indonésias contra imprensa, Nações Unidas, ONGs e população civil. Um mês se passa até que é autorizado o uso de uma força multinacional liderada pela Austrália.
       O trabalho dura um ano, e chega-se à conclusão de que mais do que uma força para garantir infra-estrutura para a ajuda internacional, é preciso construir instituições fortes no país para que se estabeleça um país com um sistema de justiça e estabilidade. Em setembro de 99, Portugal e Indonésia assinam compromisso de repassar para a ONU a administração do Timor Leste até a independência formal.

       Outro lado do mundo, 1990, Jean-Michel Aristide é eleito presidente do Haiti, o país mais pobre do mundo fora da África, com 70% dos votos depois de 30 anos de ditadura de Papa e Baby Doc. Em 91, golpe militar, condenado pela OEA e ONU. Onda de refugiados cria problemas sócio-econômicos na Flórida, República Dominicana, e em menor escala na Jamaica, Nicarágua e Honduras.
       Na música pop, um trio formado por haitianos regrava “Killing Me Softly” e é adotado pela emissora transnacional que o presidente americano Bill Clinton gosta de ver associado à sua administração. O trio é o Fugees (de refugees), e a tv é a MTV.
       E o presidente, é o que para consertar a declaração de que teria fumado maconha sem tragar em rede aberta, investiria mais dinheiro em uma operação na Colômbia como política anti-drogas. E que ao ver Aristides cair, vê no espelho um sorriso de “democracia irrestrita nas Américas” se desmanchar (o sorriso queixudo nem considerava Cuba).
       Em 93, Clinton é forçado pela chamada opinião pública (algo entre a MTV e a CNN) a permitir a entrada de refugiados no país. Um ano depois, uma resolução da ONU autoriza o uso de força para restabelecer o governo legítimo haitiano, na primeira intervenção da Organização em um país com problema interno. Até então, uma ação estrangeira por um golpe de Estado seria considerada um ataque à soberania.
       Aristides volta ao poder para completar o mandato ainda em 94, que cumpre até 96, quando elege o sucessor, com quem rompe dois anos depois, com o país de Parlamento dissolvido. O Haiti é ali mesmo, e em 2000, Aristides está de volta, nos braços do povo, em eleições fraudulentas, com polícia aparelhada. Quatro anos sem avanços sócio-econômicos e o presidente é deposto em 2004.



       2004 no Haiti, 99 no Timor: a ONU vira protagonista na resolução das crises.

       O Brasil de Lula, de olho na liderança continental, de olho em um assento no Conselho de Segurança, concentrado em superar a boa fama do sociólogo Fernando Henrique Cardoso, amigo de Clinton e Tony Blair, faz um belo e importante gesto (sem ironia) e se candidata a liderar os capacetes azuis no Haiti. O desinteresse americano de Bush contribui para o oquei. Cinco anos antes, tinha começado a intervenção no Timor Leste, com o diplomata da ONU, Sérgio Vieira de Mello à frente, em missão considerada um sucesso. O brasileiro morreria em 2003, no Iraque, depois de designado para uma missão até hoje impossível.
       A maior diferença entre as duas missões: no Haiti, a missão é de Paz, não de Ocupação, como no Timor. Há governo provisório no país da América Central, enquanto no sudeste da Ásia a comitiva das Nações Unidas tinha poderes executivos e legislativos, além de administração da Justiça. No Timor, entre os objetivos da missão estava a criação de instituições fortes (polícia, sistema público de educação, imprensa, justiça, sistema eleitoral-político-partidário, etc.). E, claro, no Timor a intervenção já terminou.



       Depois de um ano sob o comando do general Heleno, as tropas de vinte diferentes países da ONU no Haiti passam para o comando do general Urano Bacelar, no dia 31 de agosto de 2005. No último sábado, 7 de janeiro, de manhã, véspera da quarta data cancelada para as eleições do novo governo do Haiti, o mesmo general Bacelar é encontrado morto no quarto do hotel Montana. A morte se passa em um momento de crise de comando, investigações da OEA indicam que há casos de mortes de civis haitianos por erros ou abusos de capacetes azuis, o governo brasileiro critica a falta de prazo para o envio de recursos pela ONU e reclama da demora em aprovar uma resolução que permita investimentos no país antes de qualquer contrapartida na paz. A admiração pelo país de Ronaldinho, Ronaldo, Roberto Carlos e Roger já não é aquela. O general Heleno não se cansa de repetir, do Brasil, que “não há possibilidade de paz sem que ao mesmo tempo haja desenvolvimento”.
       Para piorar, há um boato de que os oficiais da tropa de paz desaprovavam a linha dura do general Bacelar, gaúcho de Bagé, disposto a acabar com as festas com mulheres haitianas, bebidas e maconha. O Haiti, além de tudo, fica ao lado da Jamaica.

       Ao se estudar a presença do brasileiro Vieira de Mello no Timor Leste, o que salta aos olhos é um regulamento datado em 2 de dezembro de 1999, de número 1272 (1999/2). Nele, cria-se um Conselho Consultivo Nacional, formado por quinze membros, onze deles timorenses de diferentes partidos políticos ou da Igreja Católica (religião da maioria da população), três membros da missão da ONU e o próprio administrador transitório, Vieira de Mello. O artigo 1.2 do regulamento é claro quanto ao objetivo da medida: “será o mecanismo principal através do qual os representantes do povo timorense participarão activamente no processo de tomada de decisões durante o período da Administração Transitória das Nações Unidas...” A ONU se presta a ouvir.

       Não há Conselho Consultivo Nacional no Haiti. O primeiro-ministro provisório, Gerard Latortue, mora na Flórida, e anda com seguranças particulares armados quando está no país que governa. Seu francês não tem sotaque haitiano. As eleições, que marcariam uma segunda etapa da presença da ONU no país, estão marcadas para o dia 7 de fevereiro, a quinta data desde o dia 31 de agosto de 2005, quando chegou o general brasileiro Urano Bacelar.



       Não sei o que há para se concluir, qual será a música do Haiti? O que ouvia Sérgio? O que ouvia Urano?




Do the Evolution, Pearl Jam

I'm ahead, I'm the man
I'm the first mammal to wear pants, yeah
I'm at peace with my lust
I can kill 'cause in god I trust, yeah
It's evolution, baby
I'm a beast, I'm the man
Having stocks on the day of the crash
On the loose, I'm a truck
All the rolling hills I'll flatten them out, yeah
It's herd behavior, uh huh
It's evolution, baby
Admire me, admire my home
Admire my son, he's my clone
Yeah, yeah, yeah, yeah
This land is mine, this land is free
I'll do what I want yet irresponsibly
It's evolution, baby
I'm a thief, I'm a liar
There's my church
I sing in the choir:Hallelujah, hallelujah
Admire me, admire my home
Admire my song, admire my clothes
'Cause we know appetite for a nightly feast
Those ignorant indians got nothing on me
Nothing, why?
Because, it's evolution, baby!
I am ahead, I am advanced
I am the first mammal to make plans, yeah
I crawled the Earth, but now I'm higher
Twenty-ten, watch it go to fire
It's evolution, baby
It's evolution baby
Do the evolution
Come on
Come on, come on

1 Opine:

At 23:19, Anonymous Anônimo said...

Nao sei o q eles ouvem, mas lembrei q Hitler era viciado em Wagner, tal qual Gary Oldman em Apocalypse Now. Parece facinar loucos sociopatas (eu gosto de Wagner. Psicopata?)

 

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