FEIRA MÚSICA BRASIL :: (balanço final)
Primeira edição deixou muito a desejar
Ignorando peças fundamentais da nova configuração da indústria da música, o evento deve servir de aprendizado.
A Feira Música Brasil, que terminou ontem no Recife, tentou dar um impulso à organização da cadeia produtiva da economia da música no país. Com o suporte financeiro do poder público (Ministério da Cultura, BNDES, Petrobras, Governo de Pernambuco, Prefeitura do Recife e SEBRAE), o evento se apresentou como "o ponto de referência de negócios da música brasileira", definição de Paula Porta, assessora especial do MinC e coordernadora do PRODEC (Programa de Desenvolvimento da Economia da Cultura). Porém, o que se viu de fato foi um evento ainda incipiente, sem a participação do setor privado, feito às pressas e ainda longe de se tornar referência de qualquer coisa.
A ausência do capital privado foi decisiva para o esvaziamento da feira. Não se viu, por exemplo, nenhum stand de empresas de telefonia, de emissora de rádio ou tv, de portais de conteúdo, nem tampouco de grandes gravadoras. O espaço era ocupado por selos pequenos (a maior representante do setor fonográfico era a Biscoito Fino), por iniciativas de fomentos regionais e, sobretudo, pelos financiadores do evento. SEBRAE e Petrobras ocuparam as maiores áreas. Afora isso, os produtos oferecidos não estimulavam o consumo. Nos cerca de 30 stands abertos ao público era possível encontrar desde instrumentos musicais até doce de leite e cachaças. Outro, era dedicado exclusivamente a produtos de limpeza e armazenamento de CDs, como se estivéssemos em 1992 e o mp3 não tivesse sido criado. Houve até expositor que não apareceu para ocupar seu stand.
Do lado das inovações, poucas coisas. Talvez a principal tenha sido o Coolnex, uma espécie de cartão, com a arte e as informações de determinado álbum. Nele, o consumidor encontra um código interno que habilita o download legal de músicas daquele trabalho para um computador, através de uma parceria com o portal iMúsica.
- É um produto que torna tangível o que antes era apenas virtual, com um conceito que agrega valor. Além disso, agiliza o pagamento ao vendedor e o acesso ao produto para o consumidor – explica Eduardo Almeida, diretor de planejamento do Coolnex.
Na FMB, estes cartões foram distribuídos de graça, mas a promessa é que em três meses estejam à venda por preços populares em todo país. Outro que chamou atenção, mesmo não sendo pioneiro na prática, foi o músico pernambucano Eduardo Kalil. Ele circulou pela feira distribuindo o próprio disco. O produto entregue por ele trazia a capa, a bolacha prensada na parte de cima, mas com a mídia virgem. As músicas, cuja ordem já vem indicada, devem ser baixadas no site do artista e queimadas no gravador de CD caseiro.
Em teoria, a principal seção da FMB era a rodada de negócios promovida pelo BNDES. Ela foi muito criticada por alguns dos participantes no primeiro dia. A agenda inicial foi organizada pela produção da feira e, com isso, os participantes perderam a liberdade de analisar e escolher com quem gostariam de conversar, sob o risco de criarem um constrangimento para si próprios. Isso foi se resolvendo ao longo dos dias e as reclamações foram se transformando em otimismo. Como as negociações iniciadas na FMB ainda dependem de conclusões que só virão nos próximos meses, não havia o cálculo preciso de qual foi o valor financeiro movimentado.
A parte artística foi a menos problemática. Com uma boa programação de shows, cumpriu o papel de divulgar nomes do cenário independente, que iam desde os pernambucanos do Bongar, passando pelos espanhóis do La Kinky Beat, até o carioquíssimo Nélson Sargento, que fez um show emocionante no Marco Zero. Sargento também foi um dos destaques da FMB por ter passado três dias ajudando a vender os próprios CDs. Os artistas vinculados a grandes gravadoras só participaram de shows na sexta-feira, quando foi comemorado os 100 anos do frevo com um grande concerto. A apresentação foi financiada pela prefeitura da cidade e contou com artistas como Gilberto Gil, Lenine, Alceu Valença, Luiz Melodia e Maria Rita. Ney Matogrosso foi um dos destaques da noite, cantando o clássico "Me segura, senão eu caio". Na ocasião, todas as referências à FMB foram retiradas do palco. Coincidência ou não, foi o único dia em que o Marco Zero ficou lotado. Conversando com locais, era perceptível que a programação da FMB, apesar de contar com três palcos, não se preocupou em divulgar fortemente os shows pela cidade. Muita gente não sabia o que estava acontecendo por ali, muito menos tinha informações sobre quem se apresentaria. Com exceção de sexta-feira, os shows acabaram sendo vistos sobretudo pelos participantes da feira.
Apesar de ter sido concebida como um evento itinerante, em 2008 a FMB acontecerá novamente no Recife. Com mais tempo de planejamento e uma edição já realizada para servir de experiência, a tendência é melhorar. Para isso, porém, será necessário abrir mais o olhar, ser mais generoso com os agentes dessa indústria e menos parcial.
- Nesta primeira edição, teve muita gente querendo ver se seria um evento de verdade. Tenho certeza de que diante desse resultado, todas as pessoas e empresas envolvidas de alguma forma com a música virão, porque a Feira Música Brasil vai ser o ponto de referência - afirma Paula Porta.
Mais do que afirmações, é necessário um bom planejamento, autocrítica e mais conversa com a indústria, para que a FMB alcance tal objetivo. Por enquanto, tudo ainda não passa de promessa.
Ignorando peças fundamentais da nova configuração da indústria da música, o evento deve servir de aprendizado.
A Feira Música Brasil, que terminou ontem no Recife, tentou dar um impulso à organização da cadeia produtiva da economia da música no país. Com o suporte financeiro do poder público (Ministério da Cultura, BNDES, Petrobras, Governo de Pernambuco, Prefeitura do Recife e SEBRAE), o evento se apresentou como "o ponto de referência de negócios da música brasileira", definição de Paula Porta, assessora especial do MinC e coordernadora do PRODEC (Programa de Desenvolvimento da Economia da Cultura). Porém, o que se viu de fato foi um evento ainda incipiente, sem a participação do setor privado, feito às pressas e ainda longe de se tornar referência de qualquer coisa.
A ausência do capital privado foi decisiva para o esvaziamento da feira. Não se viu, por exemplo, nenhum stand de empresas de telefonia, de emissora de rádio ou tv, de portais de conteúdo, nem tampouco de grandes gravadoras. O espaço era ocupado por selos pequenos (a maior representante do setor fonográfico era a Biscoito Fino), por iniciativas de fomentos regionais e, sobretudo, pelos financiadores do evento. SEBRAE e Petrobras ocuparam as maiores áreas. Afora isso, os produtos oferecidos não estimulavam o consumo. Nos cerca de 30 stands abertos ao público era possível encontrar desde instrumentos musicais até doce de leite e cachaças. Outro, era dedicado exclusivamente a produtos de limpeza e armazenamento de CDs, como se estivéssemos em 1992 e o mp3 não tivesse sido criado. Houve até expositor que não apareceu para ocupar seu stand.
Do lado das inovações, poucas coisas. Talvez a principal tenha sido o Coolnex, uma espécie de cartão, com a arte e as informações de determinado álbum. Nele, o consumidor encontra um código interno que habilita o download legal de músicas daquele trabalho para um computador, através de uma parceria com o portal iMúsica.
- É um produto que torna tangível o que antes era apenas virtual, com um conceito que agrega valor. Além disso, agiliza o pagamento ao vendedor e o acesso ao produto para o consumidor – explica Eduardo Almeida, diretor de planejamento do Coolnex.
Na FMB, estes cartões foram distribuídos de graça, mas a promessa é que em três meses estejam à venda por preços populares em todo país. Outro que chamou atenção, mesmo não sendo pioneiro na prática, foi o músico pernambucano Eduardo Kalil. Ele circulou pela feira distribuindo o próprio disco. O produto entregue por ele trazia a capa, a bolacha prensada na parte de cima, mas com a mídia virgem. As músicas, cuja ordem já vem indicada, devem ser baixadas no site do artista e queimadas no gravador de CD caseiro.
Em teoria, a principal seção da FMB era a rodada de negócios promovida pelo BNDES. Ela foi muito criticada por alguns dos participantes no primeiro dia. A agenda inicial foi organizada pela produção da feira e, com isso, os participantes perderam a liberdade de analisar e escolher com quem gostariam de conversar, sob o risco de criarem um constrangimento para si próprios. Isso foi se resolvendo ao longo dos dias e as reclamações foram se transformando em otimismo. Como as negociações iniciadas na FMB ainda dependem de conclusões que só virão nos próximos meses, não havia o cálculo preciso de qual foi o valor financeiro movimentado.
A parte artística foi a menos problemática. Com uma boa programação de shows, cumpriu o papel de divulgar nomes do cenário independente, que iam desde os pernambucanos do Bongar, passando pelos espanhóis do La Kinky Beat, até o carioquíssimo Nélson Sargento, que fez um show emocionante no Marco Zero. Sargento também foi um dos destaques da FMB por ter passado três dias ajudando a vender os próprios CDs. Os artistas vinculados a grandes gravadoras só participaram de shows na sexta-feira, quando foi comemorado os 100 anos do frevo com um grande concerto. A apresentação foi financiada pela prefeitura da cidade e contou com artistas como Gilberto Gil, Lenine, Alceu Valença, Luiz Melodia e Maria Rita. Ney Matogrosso foi um dos destaques da noite, cantando o clássico "Me segura, senão eu caio". Na ocasião, todas as referências à FMB foram retiradas do palco. Coincidência ou não, foi o único dia em que o Marco Zero ficou lotado. Conversando com locais, era perceptível que a programação da FMB, apesar de contar com três palcos, não se preocupou em divulgar fortemente os shows pela cidade. Muita gente não sabia o que estava acontecendo por ali, muito menos tinha informações sobre quem se apresentaria. Com exceção de sexta-feira, os shows acabaram sendo vistos sobretudo pelos participantes da feira.
Apesar de ter sido concebida como um evento itinerante, em 2008 a FMB acontecerá novamente no Recife. Com mais tempo de planejamento e uma edição já realizada para servir de experiência, a tendência é melhorar. Para isso, porém, será necessário abrir mais o olhar, ser mais generoso com os agentes dessa indústria e menos parcial.
- Nesta primeira edição, teve muita gente querendo ver se seria um evento de verdade. Tenho certeza de que diante desse resultado, todas as pessoas e empresas envolvidas de alguma forma com a música virão, porque a Feira Música Brasil vai ser o ponto de referência - afirma Paula Porta.
Mais do que afirmações, é necessário um bom planejamento, autocrítica e mais conversa com a indústria, para que a FMB alcance tal objetivo. Por enquanto, tudo ainda não passa de promessa.
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(texto também publicado no Globo Online)
2 Opine:
Tambem tive esse sentimento. Apesar de empresas e pessoas sérias a feira deixou um sabor de que faltava algo. As empresas do mainstream parecem não terem acreditados no potencial da feira.
Espero que nas próximas edições isso se resolva.
Caro Bruno, valeu pelo comentário positivo, espero que vc baixe também as músicas e goste!! Abraço, Eduardo Kalil.
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