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8.5.07

A tal da convergência de mídias

O papo é longo e achar o melhor jeito de começá-lo é difícil. Passei uma semana pensando nisso e ainda não estou certo. Afinal, as idéias estão todas hiperlinkadas, como você verá. Mas o fato que motiva esse texto é o seguinte: o Skank ganhou o primeiro celular de ouro do Brasil. Então vamos por aqui.

Pois bem, essa informação tem um quê de vanguarda e de anacronismo ao mesmo tempo. O tal certificado foi dado pela ABPD, a mesma que concede (concedia?) discos de ouro, platina, diamante, não-sei-o-quê. O gesto revela que o formato preponderante na indústria ainda é o do estímulo aos hit-makers. Enquanto o mercado independente se consolida por achar um caminho do meio, o investimento em catálogos, no retorno a longo prazo, as majors ainda julgam que o melhor é sempre ter um vendendo muito pra bancar as apostas que dão com os burros n’água.

Por outro lado, o celular de ouro também indica a preocupação em se achar novas perspectivas, já que depender da mídia CD é uma canoa irremediavelmente furada. É importante salientar que a premiação em questão não é “Ringtone de ouro”, nem “Download de ouro” (nessas duas modalidades, muita gente – Pitty, Dogão, Motirô, Detonautas, CPM 22, entre outros – já foi premiada). O “celular de ouro” do Skank foi dado depois do grupo ter superado a marca de 50 mil aparelhos móveis vendidos. Sendo mais claro, é o seguinte: foram comercializados 53 mil celulares que traziam uma ação de marketing diretamente veiculada ao trabalho “Carrossel”, lançado pelos mineiros em 2006. Quem comprasse o Sony W300 levava todas as faixas do disco(?) disponibilizadas em MP3 e ainda todos arquivos com as artes gráficas.

Isso indica que voltamos àquela velha perspectiva que, desde sempre, liga a indústria fonográfica aos agentes que fabricam aparelhos de reprodução de áudio. Sempre foi assim. O que causou esse rebuliço todo recentemente na indústria foi que um novo agente, a Apple, entrou nessa jogada criando um player mais interessante do que todos os outros. Resultado: bombou de vender iPod e faixas no iTunes.

No Música Chappa Quente muito se falou sobre a migração dos rendimentos das gravadoras para mídias de celular. Algumas delas estão criando departamentos específicos para cuidar desse setor. Nessa corrida, a Sony provou que saiu na frente, até mesmo porque é a única que tem um braço diretamente ligado à essa tecnologia. Afinal, ela, Sony, também fabrica aparelhos celulares. A tática é essa. Quem prestar atenção aos intervalos de alguns canais da tv paga, já pode assistir a Ivete Sangalo (Universal) lançando um aparelho (o Sony W200) que vem com dez faixas do disco “Ivete ao Vivo no Maracanã”. Mesma onda do Skank e ninguém duvida de que ela também vá levar um aparelhinho dourado em breve. No caso, a promoção de lançamento é feita em parceria com a Vivo, visando as compras do Dia das Mães. Você entendeu, né? No caso da Ivete, a Universal fez uma parceria com a Sony Equipamentos. Então...

Apesar da perspectiva otimista que números desse tipo despertam, o fato é que o mercado de música por telefonia móvel continua sendo uma grande incógnita,. É o que mostra uma recente matéria da Teletime, que também me estimulou a esta reflexão. Ao mesmo tempo em que o "mobilemusic" representa um enorme nicho - estima-se que no Brasil foram feito 60 milhões de downloads apenas de ringtones em 2006 -, os números estão na descendente. A marca atingida em 2006 representa uma queda de 20% em relação a 2005, quando 75 milhões foram baixados. Há um lado da indústria que atribui essa queda a uma migração de formatos. No ano passado cresceram o número de downloads de truetones e fulltracks, até mesmo em função de uma nova geração de aparelhos ter sido disponibilizada. Além disso, já existem empresas trabalhando para a criação de serviços de assinatura de conteúdo via celular. É o setor chamado de SVA (Serviços de Valor Agregado). O sujeito paga uma taxa por mês e tem direito a baixar "x" músicas, wallpapers, jogos, etc. Ao mesmo tempo, o que já se observa é que a música não é o conteudo mais buscado nos SVAs. E com isso começamos a olhar pro outro lado da questão.

Neste "outro lado", encara-se esse mercado como uma espécie de grande bolha, que vai estourar assim que se popularizarem os aparelhos para telefonia móvel com HDs mais parrudos. Isso permitirá uma transmissão facilitada de dados via conexões USB. Por enquanto poucos aparelhos saem de fábrica se comunicando via USB. Porém, o crescimento da venda de fulltracks (que pode vir em MP3 ou AAC - que, além de ser o formato lido pelo iPod, é ainda mais compacto que o MP3), já indica a demanda por esse tipo de arquivo, que pode ser facilmente copiado e replicado. Nessa confusão, é preciso esperar o fim de 2007 para ter mais certezas.

Independentemente de querer prever o apocalipse 2, é evidente que as grandes gravadoras estão jogando a maior parte das fichas nos celulares, apostando que eles serão a salvação de uma lavoura que está em estiagem faz tempo. O problema dessa visão é que, mais uma vez estão se esquecendo de pensar adiante, numa recuperação que (ainda) pode vir a médio prazo. Desmerecer a internet justificando-se pelo argumento da “realidade brasileira” é balela. O crescimento desse setor é tremendo, principalmente no Brasil. Além dos programas de incentivo ao acesso da população à computadores baratos financiados pelo governo federal, o próximo passo está em dinamizar o acesso à rede. Na última segunda-feira foi firmado um acordo - entre o Ministério das Comunicações e algumas operadoras de telefonia fixa - que promete um pacote popular nacional de acesso à internet discada. 10 horas por mês a R$ 7,50. Por um lado isso é um calamitoso retrato do nosso atraso, já que esse mesmo modelo era praticado no primeiro mundo em 1995, 1996. Mas enfim, o fato é de que chegou. Com dez anos de atraso, mas chegou. Quem continuar mirando só no agora, vai dançar também lá na frente. Nesse mesmo momento, a Deckdisc - uma das maiores gravadoras ditas "independentes" do país, ao lado da Biscoito Fino - está lançando o álbum do Cachorro Grande apenas para compras on-line nos 20 primeiros dias. Além disso, a campanha de marketing é via MSN, tal qual eles já tinham feito à época do lançamento do segundo disco da Pitty. Tudo isso é pouco, sim, mas também já é simbólico de quem está pensando pra outra direção.

Mas vamos voltar ao celular e à nossa trama da convergência de mídias. Quem tem acesso ao jornal O Globo pôde ver no suplemento de cultura Rio Show da última sexta-feira, um anúncio de página inteira da Oi falando do novo produto da empresa: o Oi Paggo. A nova brincadeira dos caras (que, sim, querem dominar as comunicações no mundo!) simplesmente é tipo o Napster das empresas de cartões de crédito. Através do novo sistema é possível fazer compras de maneira muito prática e só pagar no mês seguinte na fatura da conta do aparelho celular. Sem anuidade. Se esse negócio der certo, não vai ter mais esse papo de "pra comprar pela internet só pagando no cartão de crédito e que as pessoas não tem esse hábito por aqui e bla bla bla". Acesso a celular já é uma realidade tão grande no Brasil que até o mercado de música pra celular já é significativo. Mas disso a gente já falou.

Na mesma semana em que tudo isso aconteceu, o Peter Gabriel anuncia o We7, um mega-portal de downloads legalizados e gratuitos que são pagos pelos anunciantes. Essa idéia já foi praticada em escala menor por alguns desses mesmos anunciantes. O mais famoso caso é o da Coca-Cola, que já ofereceu download de músicas no iTunes através das tampinhas dos refrigerantes. É o tal do “marketing de experiência” chegando ao mundo on-line e tentando viabilizar negócios por aqui. É verdade que já tinha rolado algo assim em alguns sites, como o Revver - suposto concorrente do YouTube. Mas no We7 o buraco é mais embaixo e mais complexo. Além de se colar anúncios temporários nas músicas baixadas (dizem que depois de 4 semanas o anúncio cai), o novo sistema permite o download do arquivo, coisa que o Revver não faz. E ainda por cima a faixa vem sem DRM!!! Se vai dar certo é uma incógnita. Tudo leva a crer que sim, mas é uma experiência nova. E o fato de, eventualmente, não dar certo agora também não deve ser lido como uma sentença definitiva de condenação. Talvez ainda não estejamos preparados para isso e num futuro breve o cenário necessário se componha.

Tá tudo aí, batendo na cara de quem quiser ver só um pouquinho. Não duvide de que essa indústria possa dar a volta por cima. É questão de saber olhar pra frente.


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