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Bernardo Mortimer
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Bruno Maia
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11.4.06

Ouvidos atentos

Samba da Pizza


      O presente passa, o presente muda, a obra-de-arte fica. E o Lula? Que dia é hoje mesmo? Ah, sim. Mais do que um tanto faz, é a surpresa do mentiroso, ou pior, do arauto da verdade da transmissão ao vivo da vez. O tempo passa, e o luladepelúcia ocupa o cargo máximo da nação. O PT não é o partido que era antes de 2003, ou é e não dava para desconfiar. O núcleo duro foi o que se desmanchou no ar.
      A arte datada nem sempre é o contrário da arte eterna, e é fácil derrubar tanto um quanto o outro rótulos. O complicado é mexer com a arte que veste a camisa do jornal do dia, do último plantão do canal de notícias a cabo, da última atualização do blog do jornalistão do site. Quando o conceito de arte aberta incorpora o excesso de informação de um personagem que adora mídia, e que é amado e odiado historicamente em doses iguais pelos homens por trás de teclados, microfones, máquinas fotográficas ou gravadores, não dá pra entender aquilo definitivamente. Sempre haverá um dia seguinte para que a obra se torne outra coisa, uma curiosidade em descobrir o que era a obra quando só idéia.
      João Moreira Salles e Eduardo Coutinho tiveram dúvidas sobre reeditar os documentários ‘Entreatos’ e ‘Peões’ por causa do escândalo de José Dirceu e da matéria estranha de um Larry Rohter. O correspondente acabaria peça de folclore de gringo louco no carnaval. Um dos diretores cortou cenas do filme pensando nos novos significados que não estavam ali na hora da gravação. A Folha de São Paulo questionou.
      Herbert Vianna nunca mais incluiu ‘Luís Inácio (300 Picaretas)’ em um set list do Paralamas do Sucesso. Dinho Ouro Preto entrou com o Capital Inicial em um projeto de regravar o Aborto Elétrico e recolocou ‘Que País É Esse?’ pela infinitésima vez na lista de mais tocadas. O Titãs também picaretou o punk com um refrão de palavrões em ‘Vossa Excelência’.
      O artista plástico Raul Mourão não precisou tomar nenhuma decisão. “O que era apenas um trabalho de arte cheio de ironia e bom humor se transformou num brinquedo assassino”. A aura do luladepelúcia está na cabeça do público. Se era cheio de ironia e bom humor, assim ficou. O mau humor é nosso. E de assassino o brinquedo não tem nada. Ou pelo menos cada sentença que escolha que cabeça é a que rola, e como.

      O domingo à noite já tinha virado madrugada de segunda, e a larica já ia para o segundo xisburguer de posto de gasolina quando Jards Macalé entrou na loja de conveniência falando besteira e comprando cigarro. Atrapalhado, daquelas formas que o vapor barato e a hora adiantada explicam, se molhou com um líquido qualquer que a hora barata e o vapor adiantados impedem a lembrança. Foi aí que veio a aproximação, e daí o assunto, em cima de uma manchete qualquer da revista semanal.
      - Tão afundando o governo.
      - Mas o Alckmin? Não afunda nem São Paulo, esse aí.
      - Que Alckmin, governo que é bom se afunda sozinho, sem ajuda.
      - É, e esse tá mais competente que a oposição pra se detonar.
      - É que o governo não gosta de terra firme.
      - Não gosta de terra firme, de enterrar firme...
      O Jards adorou o trocadilho safado. Ficou pulando fazendo gestos de enterrar firme que é melhor não repetir aqui, e fazendo prffff com a língua pra fora.
      No mesmo dia, madrugada feita tarde, Palocci caía. Macalé falou, Macalé avisou.

      Brinquedo assassino ou governo suicida? (E paranóico, e neurótico, e às vezes esquizofrênico, mas isso fica pra outro texto.) Caído Palocci, o luladepelucia vira outra coisa. Um homem só, sem querer sair do poder. Sem ter quem defenda a mudança de perfil da dívida, o maior salário mínimo em muito tempo, o fim do nepotismo, os recordes do comércio externo. Sem ter quem evite os ataques aos juros já irreais, o crescimento do PIB e da indústria abaixo de qualquer expectativa, a política social eleitoreira, a educação básica com menos verbas do que a superior, as obras em estrada sem resultado.
      Na mesma semana da queda, uma pesquisa Ibope revelava a partir de 13 perguntas sobre pecados acessíveis do dia-a-dia como comprar um produto pirata ou apresentar um atestado médico falso para faltar ao trabalho: quanto mais educado, quanto mais alta a classe social, quanto mais ao sul do país, e quanto mais jovem é o brasileiro, mais tolerante ele é com a corrupção. Quer dizer, brasileirodepelúcia também não vai faltar?

      A dança no plenário do Congresso é a da criança abandonada sem luladepelúcia. Todos seremos falcões. Ou todos já somos falcões, os do Fantástico, e pronto. Quem sabe eu não sou mais uma garotinha... Já era.
      Palocci, no dia da despedida do governo: “Talvez eu tenha falhado na minha crença na convivência pacífica. Talvez ela seja ingênua”. Paloccidepelúcia, cínico ou trouxa, o Brasil perdeu mais um tanto de ingenuidade com um fim de governo duro e áspero. Nada a ver com pelúcia.

1 Opine:

At 10:58, Blogger Bruno Maia said...

(imitando a voz dos humoristas que imitam o Lula)
Companheiro Bernardo,
Eu devo 'de admitir' que o trabalho do senhor nesse último texto esteve acima da média e muito se parece com o que temos visto no 'espetáculo do crescimento'.

Marisa gostou muito.

 

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