Starbucks, Zweitausendeins e as elocubrações...
Seguindo as impressões européias, na sexta-feira à tarde, um passeio pelo centro da Colônia. Não tardou a surgir na frente a primeira das várias lojas que a Starbucks mantém por aqui. E eu, como feroz anti-cafeína que sou, só poderia ter asco e vontade de passar longe de tal ambiente fétido. Porém, algo me chamava para lá. Preciso dizer o quê?
Pois é, queria ver qual era do disco do Paul. Se era verdade mesmo, como que ele ficava vendido, quanto custava, se vinha numa promoção “leve 35 cappucinos e ganhe um Paul McCartney”, sei lá. A priori, nenhuma divulgação explícita chamava a atenção do pedestre para o fato de que ali, sim, era uma loja de música. A Starbucks vende café e ponto. Nos corredores internos tampouco havia qualquer citação. Na estante de souvernirs, canecas, toalhas, ursos de pelúcia e talz... Ali, no último caixa, quando já achava que era lenda essa história de Hear Music, vi um negocinho com uns cds dentro. Tipo no esquema “chiclete em banca de jornal”. Fica do lado do caixa pra te seduzir no momento em que você já está com a carteira aberta. Nada de Paul McCartney, apenas duas compilações. Uma de Bob Marley e uma outra que eu já esqueci. Mas de fundo, havia o “wallpaper” com a cara do fab. Fiz fotos.
fotos: Bruno Maia
Pedi ao Selim que perguntasse ao vendedor se não havia aquele cd pra vender. O cara demorou a entender. Parecia que ninguém nunca havia lhe pedido um CD até então. Consultou alguém lá dentro, via rádio. Talvez houvesse algo no estoque. Foi checar. Enquanto isso, o outro rapaz do caixa explicava que aquilo estava ali como resíduo do lançamento do disco “quando a gente foi obrigado a vender aqui... depois disso, nunca mais”. Não, não havia mais em estoque, mas na outra loja, uns 300 metros mais adiante, nós encontraríamos. O gentil atendente disse que, inclusive, já tinha reservado um pra nós.
Os alemães acham muito feio se você reservar alguma coisa e não for buscá-la. Por isso, o Selim disse que precisávamos ir à outra loja, mesmo que para dizer que não queríamos mais. Assim fizemos. Chegamos lá, um mendigo estava chapado, dormindo, em frente ao caixa, estatelado no chão. Lá, já não havia Bob Marley. Só Paul. Peguei um exemplar. 14,95 euros. Não rolaria, óbvio. Saquei a máquina do bolso novamente e o vendedor dessa loja começou a colocar a mão na frente dos produtos dizendo que aquilo era proibido. Não se pode ligar câmeras nas lojas da Starbucks. Selim, com muita presença de humor, perguntou-lhe de bate-pronto: “Ficar bêbado e dormir no chão da loja pode, mas fazer fotos não?!? Ok, tá certo”. O rapaz ficou mais gentil quando percebeu um sotaque em minha não-germânica voz e quis saber se eu era espanhol. Brasil sempre abre portas e ele então falou. “Faça a foto rapidamente. Vou fingir que não vi”. E assim saímos de fininho. Já não sabia porque estava fotografando o Paul no caixa da Starbucks. Mas era preciso.
Mais 50 metros a frente, o paraíso na Alemanha se clareava. Zweitausendeins. Ou Dois Mil e um, em bom português. Tive minha primeira experiência lá, na filial de Hamburgo, no ano passado. Depois, cheguei a vir na de Colônia por breves minutos. Dessa vez, já sai do Brasil mentalizando este lugar. Que falta fazem as lojas de disco na rua, né não? Depois de investirem pesado nos grandes vendedores por atacado, a indústria fonográfica brasileira conseguiu quebrar com o último nicho de mercado que ainda se interessava, de fato, pela música como fetiche, objeto, que eram os freqüentadores de lojas de CDs. Hoje, estão todas quebradas e as megastores cada vez ligam menos para música, já que seu público não vê muita diferença entre um disco original e um pirata. Sua relação com música é meramente instantânea. Mas enfim, voltando. Zweitausendeins é uma rede de lojas de rua, com preços de discos de sebo, só que são todos eles novos. Livros, caixas, coleções... Não chega a ser uma megastore especializada. Não. São lojas pequenas e não se furtam às limitações que isso implica. Separados por época e, vez por outra, por gênero, os discos podem ser apalpados em ordem alfabética. Ao longo das paredes sobre as bancadas com CDs, milhares de livros – que mais do que livros, são verdadeiros objetos de decoração para qualquer casa!! – formidáveis e tentadores. Os preços são sempre em promoção.
No ano passado, além de uma caixa de Bach (mais por decoração do que pela prática de ouvir), outra especial do Pet Sounds e uma do Miles Davis, foram comigo para o Brasil raridades dos Kinks, Mavis Staples, Mongo Santamaría, John Lee Hooker, Ella Fitzgerald, Hans Albert e mais uma cacetada de coisas que superavam a marca de 20 CDs e 140 euros na minha conta. Ta ruim? Mais de 20 CDs? Bons e raros, sendo que a maioria não se acha no Brasil?! Não tá, né... A maioria fica entre 2,99 e 5,99 euros. As caixas levantam um pouco mais a conta, mas nada que não seja justificável e que dê um prazer fudido em carregar aquele peso todo depois, por horas a pé...
Esse ano, talvez influenciado por ela, o foco ficou sobre uma certa soulmusic. Marvin Gaye, Aretha Franklin foram acompanhados por Ray Charles, Coltrane, Baker, Beatles ao vivo em Tóquio, e mais algumas coisitas. Três livros cheirosinhos. Um scrapbook de Dylan (o mais caro, 15 euros) de morrer! Até o convite de formatura do jovem Robert Zimmermann ele traz! E não é a foto do convite! É “o” convite! Impresso num papel igual ao original, tal qual as cópias das folhas de caderno onde o jovem rapaz rabiscava as primeiras linhas... Enfim, daqueles que os outros só podem encostar de luvas! Outro, mais um de fotos dos Beatles. Um dia eu canso de comprá-los. E o terceiro, 5 euros, um livro de ilustrações inspiradas nas letras de Greendale (2003), do Neil Young. O disco, uma quase ópera, novela, sei lá, é aquele inspirado na tragédia da família Green, em uma pequena cidade da Califórnia.
Mais do que a alegria de novamente ter a chance de estar na Zweitausendeins, o principal sentimento é o de frustração pela realidade dessas lojas no Brasil. É incrível como as grandes gravadoras conseguiram acabar com o seu produto de sustento.
Vida que segue, novos passos virão.
2 Opine:
À que você atribui essa diferença de preço entre aquele mercado e o nosso, brasileiro?
Você acha que as grandes gravadoras podem equiparar o preço dos cds aqui com esses preços de lá que você citou?
Obrigado!
Fala Renato!
Cara, nao sei se eh muito a onda de igualar ou nao, ate porque, numa media, na europa eh muito mais caro do que no brasil. acho que o lance eh valorizar quem gosta mesmo de musica. esse eh o publico que pode manter o negocio rolando daqui pra frente. acho q a producao vai ser em menor escala. isso me parece definitivo, a nao ser que se invente uma nova midia que demore anos ate ser quebrada (coisa que me parece impossivel).
valeu pelo comentario!
abs
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