Entrevista: Lucas Santtana
É Preciso Dizer Que a Luta Ainda É ÁrduaA gente costuma discutir muito essa coisa de dar agenda aqui no sobremusica. Rolam dúvidas sobre essa atualização, a gente acha que nas nossas atribuladas e nada moles vidas não dá para garantir um serviço que abranja o que rola de legal mesmo, e tal. Apesar de ir seguindo, a dúvida fica: fazer incompleto e na medida do que dá, ou manter um critério de não anunciar nada com antecedência, a não ser que renda um texto, algo além do servicinho data/preço/o quê. Além do mais, a idéia aqui não é ser o lugar de ponto de encontro da galera, centralizar as atenções, transmitir tudo. O sobremusica é mais um "entre e fique à vontade" para quem tiver a fim de acompanhar pensamentos e experiências particulares com música, nesse início de milênio tão cheio de estradas abertas.
Mas direto ao ponto: recebemos os dois um email na semana passada que começava assim "Ae rapaziada, nao vou fazer filipetas fisicas para o show". Era uma decisão curta, não necessariamente a primeira do tipo, mas uma mudança de percurso que indicava uma cabeça maquinando coisas e posturas. Taí. A cabeça de Lucas Santtana, um cara que já rondou por aqui mas nunca teve o devido espaço a ele dedicado. Portanto, de olho na idéia de ser um site tranx, aberto ao que há de bom, rolou a troca de emails rápida, fechando idéias Lucas-sobremusica que já vinham rolando em encontros pela cidade. Taí o que saiu da nossa correspondência breinstorme coletiva. E quinta à noite tem o som à vera.
sm: Blog, codinome, portal, selo... Que tipo de "frankstein" é o Diginóis e o que norteia cada passo desse ser?
LS: Acho que o diginois é isso tudo. Sintetizando, é onde concentro minhas atividades, não só meus discos mas tudo em que estou envolvido ou envolto. O que norteia é o que vai acontecendo tanto em relação aos trabalhos como em relação às novidades encontradas nesse novo hábito diário de se informar através da web 2.0. Como era antigamente ler um jornal impresso todo dia ou assistir o jornal das oito.
sm: Você é um artista muito envolvido na questão da eletrônica, da internet. Isso desde participações como instrumentista em discos como o Quanta, do Gilberto Gil, e o Afrociberdelia, do Chico e Nação, mas também no teu trabalho solo, como na música eu@.com.você ou ao se aproximar do funk carioca e do dub jamaicano, estilos essencialmente ligados à tecnologia. Como você vê o momento atual para a música, incluindo na resposta a questão da conectividade do brasileiro?
LS: O momento que estamos vivendo é tão importante que nem mesmo a gente se dá conta. Eu mesmo vivo reclamando que as coisas não avançam, mas é só pensar na internet 5 anos atrás que a gente percebe que ela está voando. Estamos vivendo uma revolução, sem exageros. Música e tecnologia na verdade sempre andaram juntas. É que a gente só associa tecnologia a máquinas modernas. Quando Bach fez o “ O Cravo bem temperado”, ele estava usando um novo sistema tecnológico para instaurar um novo sistema de temperamento. Logo depois veio o piano. Me sinto muito bem em estar sintonizado com as ferramentas disponíveis no meu tempo. Claro que ainda acho que muito pouca gente no Brasil está conectada, mas recentemente fui ao meu Candomblé lá na Bahia, do qual faço parte há 13 anos, e pela primeira vez se falou em internet, orkut, etc. Eles estão se conectando via lan houses. Então vamos torcer para que esse processo de inclusão digital se dê também de forma acelerada.
sm: E na tua carreira em específico? Você usa o selo do creative commons no teu site, abre músicas para remix, permite o download de faixas, e agora resolveu concentrar a divulgação em filipetas virtuais, na rede de contatos dos teus amigos e de amigos de amigos (pra usar termos internéticos). A internet já é um caminho efetivo para o artista ou ainda falta chão?
LS: Vamos ver quinta feira. hahahaha... Brincadeira. Já é um caminho efetivo sem dúvida. É que como disse o [artista plástico e chappa] Raul Mourão outro dia, “passar do vinil pro cd foi fácil. Passar do cd para o disco rígido ou ipodes é que é mais demorado”. Mas claro que daqui a pouco todo mundo vai ter computador e ipod como já tem dvd e cd player hoje. É uma mudança muito radical que vai precisar de um tempo para se consolidar. Tive uma experiência positiva com o diginois. O cd físico esgotou em 7 meses. Só tenho 60 cds em casa para usar com portifólio. Então o fato de disponibilizar de graça foi bom para vender o físico. Mas foram apenas 2 mil cópias. Os downloads de faixas do cd e abertas juntas já ultrapassou 10 mil. Não tem comparação. Então acho que é só pensar numa escala de tempo e conectividade para isso virar algo bem maior e mais viável para todo mundo. Mas também é preciso dizer que a luta ainda é árdua. Por isso a importância da construção dessa nova rede de amigos e amigos dos amigos.
sm: Ainda no teu site, tem lá o selo da Petrobras. O disco 3 sessions in a greenhouse foi gravado com dinheiro captado em edital cultural, e teve tiragem limitada já esgotada. Você acha que essa saída, de financiamento (público ou privado) feito por empresas que não são gravadoras pode ficar mais comum?
LS: Escrevi um texto que está no diginois e no overmundo sobre isso. Acho que já que a cultura tem sido subsidiada em todas as suas áreas, ela tem que ser paga na sua cadeia produtiva e depois circular gratuitamente. É dinheiro público. Se a lei fosse modificada e fosse obrigado a diversas empresas a abrirem seus editais, teríamos uma quantidade e variedade de curadorias maior, além de uma também maior descentralização de estados contemplados e isso geraria mais mercados independentes do eixo Rio-São Paulo.
sm: Na sua opinião, considerando os processos de flexibilizaçao dos direitos autorais, em cuja discussão você é figura ativa, o que a "seleção natural" (a que te acompanha ou a de Darwin) guarda para os compositores daqui pra frente? O cara que vive de renda por direito autoral já era?
LS: Meu caso é um exemplo enriquecedor. Sou filiado como compositor à BMG Publishing, uma major. Fui à sala do Presidente e conversando com ele mostrei que nós não ganhávamos nada com arrecadação via download pago. Mostrei também que com o creative commns poderiamos continuar garantido meus direitos autorais com execução em rádio, tv, cinema, etc e poderíamos ao mesmo tempo liberar na web. Claro que ele concordou. É simples. Se o SBT tocar quero ganhar, se um garoto em Boa Vista quiser baixar de uma lan house quero liberar. É justo e eu decido isso. Esse é o up-grade do creative commons. O que acontece é que as pessoas não sentam para conversar e ficam esses trogloditas de gravadoras querendo prender garoto que baixa música em casa. São uns idiotas completos e dessa maneira vão perder a batalha. Aliás já perderam.
sm: O que esperar de quinta à noite, no Cinemathèque?
LS: Uma noite de celebração desses novos tempos perguntados e respondidos aqui. Às vezes me lembro das pessoas que viveram os anos oitenta e que falam da efervescência da cena, que eles se sentiam participando de um momento único. Senti a mesma coisa no show do Fino Coletivo, na festa do Urbe, acho que está rolando isso de novo, só que agora rolam muitos estilos, o que unifica é o fato de ninguém mais estar fazendo filipetas físicas. Hahahahaha....Para mim vai ser um show siginificativo pois o Giló( baterista) está indo morar em Nova York e é o último show dele na Seleção Natural. Tocamos juntos há seis anos e é um cara que eu gosto e respeito muito!
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